sábado, 20/abril/2024
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O legal e o imoral

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O candidato tucano ao Senado, Rogério Salles, afirmou ser legal receber aposentadoria mensal de R$ 15 mil por ter ocupado o cargo de governador de Mato Grosso por apenas oito meses. É legal, sim. O candidato tem toda a razão. Ocorre, no entanto, que, como sabe ele, o legal nem sempre é moral e ético. A questão está aqui: um pleiteante a um dos cargos mais importantes da República brasileira, que entrou numa disputa eleitoral pregando a ética pública e exigindo de seus adversários tal postura, tem que ser exemplo e não aceitar imoralidades e ser desonesto com a população mato-grossense.

Eu sempre tive Rogério na minha conta de homens públicos admiráveis. Nunca imaginei, porém, que sua fama de bom moço não resistisse a uma campanha eleitoral, ele que até agora nunca havia enfrentado um embate verdadeiro, se limitando na vida inteira a se eleger vice. Foi vice de Carlos Bezerra – que, aliás, foi quem o levou para o mundo da política. Pode-se dizer que o político Rogério Salles é uma cria de Bezerra, o mesmo que agora ele tanto abomina. Foi vice de Dante de Oliveira. E agora é vice de Percival Muniz, o mesmo que ele em outros tempos abominou. Nesta condição, Salles sempre esteve blindado nos embates e nunca havia colocado a cara a tapa.

Agora, não. Nestas eleições ele teve que aparecer nu, sem a maquiagem do bom-mocismo. Para seu azar, nesta condição não há espaço para hipocrisias e o Rogério “bonzinho” está sendo confrontado com o Rogério “maldoso”. Justamente porque ele próprio vem se prestando ao papel da maldade, deixando de travar o debate político, de ideias e propostas para se lançar à escuridão do ninho dos maldosos de sempre. Ou seria apenas a máscara caindo?

A aposentadoria dele de R$ 15 mil, que faz dez anos – num montante de mais de R$ 2 milhões -, além de uma imoralidade é um acinte, um desrespeito para com o cidadão que tem que trabalhar por 30, 40 e até 50 anos para receber mísero salário.  Fico imaginando o pobre trabalhador da Vila Operária, bairro tradicional de Rondonópolis, que terá que viver com 5% do que Rogério recebe todo mês do dinheiro público dos impostos pagos por aquele trabalhador e demais mato-grossenses.

O acinte e a imoralidade são ainda maiores por outras razões. Rogério se aposentou com apenas 49 anos de idade. Além disso, ele é um homem rico, um dos ícones do agronegócio mato-grossense, proprietário de fazendas e de empresas rurais e urbanas e com sólida formação profissional. Isto lhe permite ter uma vida sem problemas financeiros, diferentemente da esmagadora maioria dos eleitores, que amargam décadas à espera de uma aposentadoria que muitas vezes não chega antes da morte.

O Rogério “honesto” e “ético” poderia não ter aceitado a aposentadoria, instituída por uma lei imoral – que, aliás, ele como governador, poderia ter lutado contra ela. Mas não. Salles ficou quietinho no seu canto, só esperando para se beneficiar. Uma atitude matreira, própria dos oportunistas e longe de quem prega a ética e a honestidade. Eu gostaria que ele me explicasse como funciona esta sua postura de duas caras, de duas personalidades, esta dubiedade que parece incorrigível.

João Negrão é jornalista em Brasília

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